academia do sabor

Fazer conservas é a maior onda

A produção de fermentados é simples, boa para fazer em casa

 

Em 2010, o mundo da gastronomia se voltou para a Dinamarca. O Noma, sob o comando de René Redzepi, era eleito o melhor restaurante do mundo. Camarões vivos à parte, o primeiro tema que o chef fez questão de divulgar mundo afora foram os picles e o fato deste método de conservação de alimentos ser tão subestimado. E era fácil embarcar no que ele chamava de “histórias de amor” ao provar pétalas de rosa, flores de sabugueiro e ramson (um tipo de alho selvagem) que ele havia colhido na mata, coberto com vinagre em potes enormes e guardado por pelo menos seis meses para sentir no rigoroso inverno nórdico um gostinho de verão.

 

 

Suas conservas eram arredondadas, o ácido aparecia domado e os aromas exalavam algo de maduro, de vibrante, como um vinho que envelhece bem. Era a casa da vovó vindo à tona em cozinha de vanguarda. Era também um discurso que fazia e continua fazendo igualmente todo o sentido para o Brasil: se há uma abundância de frutas, legumes e ervas aromáticas, é preciso encontrar uma maneira de preservá-los! 

 

Compotas, conservas, chutneys, geleias, pestos, tapenades e afins existem exatamente para isso. As possibilidades são ilimitadas, mas há uma regra básica e obrigatória: higienizar os produtos e esterilizar os potes que os guardarão. Nada muito complicado: lavar frutas, verduras e legumes e depois mergulhá-los numa solução de cloro por meia hora (para cada litro de água, uma colher de sopa de água sanitária é suficiente). 

 

 

Em relação aos frascos, é preciso fervê-los por dez minutos e depois secá-los no forno bem baixo (cerca de 100°C) pelo mesmo tempo. Já as tampas podem ser fervidas por apenas dois minutinhos. 

A partir daí é abusar da sazonalidade (afinal, na época certa os alimentos têm melhor qualidade, cor mais vibrante e sabor mais intenso), lembrar que vegetais e frutas naturalmente firmes e com crocância são à prova de erros, mas que quanto menores o pedaço mais rápida e intensamente ele absorverá o líquido ao seu redor.

 

 

Mineira de Iturama, a banqueteira Gil Gondim, autora de Conservas do Meu Brasil (Editora Senac), partiu das memórias da infância, quando ajudava a mãe no preparo de conservas adocicadas, para reunir mais de 50 receitas. Dividida entre a paixão por compota de mangaba, geleia de jabuticaba e doce de leite, ela definiu um critério para dividir seus preparos.

 

Chamou de compotas o que era feito com frutas inteiras ou em pedaços e que levavam calda de açúcar; de doces o que remetiam ao receituário familiar e dependiam de cocção lenta em fogo brando; de geleias, frutas e ingredientes como cachaça e pimenta que iam ao fogo com açúcar e ácido até se tornarem gelatinosos; de conservas salgadas o que tivesse como base uma salmoura, vinagre ou vinho, azeite ou outro óleo, por exemplo; de antepastos e picles, combinações de produtos saborosos e coloridos que pudessem ser servidos com pãezinhos e torradas – ou acompanhando grelhados, por exemplo.

 

 

Há ainda conclusões que o leitor mais atento tira da obra. Uma delas? Para um picles, uma boa salmoura equilibra vinagre, sal, açúcar e água. Mais: ele ainda leva um quê de especiarias ou ervas – sementes de mostarda e de coentro, cúrcuma, dill, estragão e o que a imaginação e o paladar autorizarem. O líquido é fervido e depois despejado sobre os legumes em frascos. Vale apostar em ingredientes coloridos como milho fora da espiga, couve-flor roxa, casca de melancia, couve-de-bruxelas, cenoura…

 

No caso de compotas, doces e geleias, frutas delicadas e suculentas como a pitanga ou a amora, não devem ser mexidas durante a cocção para não amargarem o preparo. Frutos cítricos (como os diferentes tipos de limão, tangerina e de laranja) rendem boas receitas para o verão, já que trazem inevitavelmente notas refrescantes.

 

 

Algo mais peculiar? Por meio de conservas e afins é possível privilegiar ingredientes regionais, de difícil acesso. Um exemplo é o pirarucu: “Morei em Rondônia por alguns anos e lá descobri o sabor ímpar desse peixe de água doce. Os portugueses fazem muito escabeche de pescados, então pensei, por que não usar o bacalhau brasileiro para criar um antepasto? O resultado é único!”, ensina Gil.

  

Além de as receitas serem simples, não dependerem de equipamentos e técnicas sofisticadas, manter potinhos de vidro preenchidos com elas na dispensa ou na geladeira é uma forma de valorizar o trabalho de pequenos produtores, de manter o frescor do que foi comprado fresquinho e ficar atualizado de uma maneira leve e contemporânea, ainda que baseada em costumes culinários ancestrais.

 

Aqui mesmo no site, nós temos receitas bacanas para você fazer em casa e descobrir o caminho para fazer ótimas conservas, antepastos e picles ao seu gosto. Dá uma olhada:

 

> Conserva de tomate orgânico

> Caponata

> Conserva de pimenta cambuci recheadas

> Conserva de quiabo

> Conserva de pimenta dedo-de-moça

> Picles de mamão