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O sorvete que dá em árvore

Conceito verde e sustentável vira gelato e faz sucesso 

Robert Halfoun
Curador


A família da Fernanda Pamplona, uma das responsáveis pelo tanto de gente que se reúne num cantinho fofo do movimentado bairro de Pinheiros, em São Paulo, volta e meia vive um quase ritual que começa todos os sábados, às cinco da manhã. Ela, o marido Mario e as filhas Clarissa e Aurora, pulam da cama para ir à feira de orgânicos do Parque do Ibirapuera. Lá, tomam suco verde e depois conversam com os produtores do cinturão agrícola em torno da capital, em busca dos melhores ingredientes, com os quais são feitos os gelatos da Albero dei Gelati, a filial paulista de uma das gelaterias mais faladas da Itália, em Milão.

 

Fernanda Pamplona, o marido Mario e Fabio Solighetto, da família que criou a Albero, na Itália

 

O esforço garante que a produção seja quase toda realizada a partir do conceito do km 0, aquele no qual a matéria-prima percorre a menor distância possível, entre o produtor e o consumidor. Fernanda, uma pessoa de fala suave e tem astral mais leve ainda, explica o trabalho com o maior orgulho, apesar de uma certa timidez.

 

Antes de fazer gelato, ela trabalhou com agricultura, num projeto da Prefeitura de São Paulo. Ali, diz, nasceu o amor pelo produtor e pelo campo. Mais do que isso, lhe deu a oportunidade de fazer amigos agrônomos que a ajudam a encontrar os agricultores que trabalham de forma orgânica e sustentável.

 

» 9 passos para fazer sobremesa com gelato

 

Quando foi para a Itália, em busca de qualidade de vida e “de mais tempo para conhecer as filhas”, pensou em juntar a experiência agrícola com a produção de gelatos. Encontrou tudo o que queria ao descobrir o trabalho da família Solighetto, famosa desde 1985, por fazer um produto natural, fresco, saboroso e artesanal. 


Então, quis se aproximar para, quem sabe, trazer os gelatos deles aqui, quando voltasse para o Brasil.

 

A vitrine da Albero varia toda hora porque os gelatos estão sempre frescos, com os produtos do dia

 

A Albero dei Gelati, no entanto, é um negócio absolutamente familiar e os donos nem sequer cogitam entregar a produção na mão de estranhos. Para se ter uma ideia, quando surgiu a oportunidade de abrir uma loja em Nova York, a Monia Solighetto e o marido dela, o Alessandro Trezza, foram morar lá para tocar a empreitada.

 

Diante da montanha, Fernanda resolveu escalá-la pelas beiradas, a receita de sucesso de quem quer chegar ao topo. Conseguiu uma vaga de balconista na loja de Milão e, aos pouquinhos, foi conquistando a simpatia e a confiança dos italianos. Até que apresentou produtos brasileiros para eles. Então quebrou o gelo e ganhou o coração da turma. A semente para o nascimento da árvore (albero em italiano) estava plantada. Até que o Fabio, que toca as lojas na Bota, veio para cá com eles abrir a primeira loja.

 

Aqui, os copinhos são comestíveis, feitos de polvilho. Eles se desfazem mesmo que não sejam consumidos: lixo zero 


É ele, diz a Fernanda, quem ainda desenvolve as receitas, com as matérias-primas daqui, na Itália. “Nós, digamos, colocamos as nossas humildes opiniões.”  O que se come aqui é exatamente o que se come lá, mesmo com correções que precisam ser feitas, como o percentual de açúcar, uma vez que, muitas vezes, as nossas frutas são mais doces. 


Fernanda Pamplona e o “gelato agrícola” que usa produtos do cinturão rural onde ele é produzido

 

Falando em doçura, o sabor bem natural dos gelatos da Albero é principal motivo do sucesso da gelateria por aqui. E sabores inusitados como ricota com amaretti (os biscoitinhos italiano), queijo Canastra com mel de Jataí, sorbetto de ciocolatto e spirulina. Este último é o campeão de audiência da casa. A alga azul-verde que cresce tanto na água doce quanto na salgada dá origem a uma massa com sabor muito elegante, que remete a um licor fino, sem qualquer sinal de álcool – até porque não tem mesmo. Tudo isso com uma cor linda que seduz pelo olhar.

 

O jeitinho de casa de campo, com uma estrondosa árvore diante dela, é mais um ponto que faz com que as pessoas parem na loja, mesmo sem saber do rico produto que se faz ali. A linguagem é uma tradução estética do pensamento sustentável que a Fernanda busca para a vida. “Eu crio uma criança e uma adolescente, não posso pensar de outra forma. Este projeto também diz respeito a dar um exemplo de futuro para as meninas.” Elas não só vão à feira dos orgânicos, assim como acompanham a mãe na visita aos produtores.

 

Afogatto com um senhor gelato é cafezinho ou sobremesa?

 

É essa proximidade com o campo que gerou o slogan “gelato agrícola”, por mais que corressem o risco de o cliente achar que “encontraria uma vaca dentro da gelateria”. A Aline, 19 anos, atendente que veio do Mc Donald’s e é a primeira a fazer a maior propaganda da filosofia da Albero, se encarrega de mostrar que tudo o que há no fundo da loja é uma caixa de compostagem. 


Albero dei Gelati – R. Joaquim Antunes, 391, Pinheiros, São Paulo – SP. Tel.: (11) 3063-1821